A pesquisa busca uma película contendo nanopartículas, com potencial para reduzir problemas de contaminação microbiana, além de melhorar as propriedades de permeabilidade da casca, reduzindo a degradação interna, o que permitirá maior tempo de armazenamento, e adicionalmente incrementará a resistência da casca a impactos, mantendo características e propriedades nutritivas. No momento, a tecnologia está em fase laboratorial. Na etapa seguinte, ela deverá ser testada e validada por parceiros para averiguar sua viabilidade.
De acordo com a pesquisadora Helenice Mazzuco, no Brasil não há obrigatoriedade de lavagem, desinfecção e refrigeração dos ovos comercializados in natura, mas a indicação é a de mantê-los sob refrigeração entre 4°C e 12°C por um período máximo de 30 dias. "Passado esse período, o alimento pode sofrer deterioração. Com o revestimento nanoestruturado, que está sendo pesquisado, busca-se igualmente maior controle da contaminação externa (via casca) propiciando, assim, aumento no tempo de prateleira [validade] dos ovos", explica a pesquisadora.
O ovo é um alimento perecível. Assim como carne e produtos hortifrúti, tem vida útil limitada para o aproveitamento adequado de seus nutrientes. Uma vez perecíveis, é preciso protegê-los por meio de refrigeração para evitar a perda de água, reduzindo as trocas gasosas. "Essas trocas gasosas acarretam, muitas vezes, mudanças físico-químicas nos ovos, comprometendo a qualidade do alimento e abrindo espaço para contaminação", esclarece a pesquisadora Helenice Mazzuco, líder do projeto Nanovo.
Apesar de apresentarem muitos mecanismos de defesa, como a casca e a membrana da casca, os ovos de mesa necessitam de um armazenamento adequado, uma vez que estão sujeitos às alterações e ações do tempo. A causa mais provável é a de combinação de temperatura e umidade durante o armazenamento, principalmente quando muito elevadas e por longos períodos.
A aplicação de revestimento em alimentos já é uma prática que vem sendo utilizada pela indústria alimentícia para prolongar a vida útil dos alimentos. Um exemplo é a aplicação de cera em frutas cítricas ou maçãs, que além de proteger, confere melhor aspecto ao alimento, deixando-o mais atraente (brilhante) ao consumidor, e pode ser ingerido sem risco à saúde. Com a nanotecnologia novas embalagens e revestimentos se tornaram alvo de pesquisa para incrementar a proteção e melhorar o aspecto de alimentos.
A pesquisa em nanotecnologia
No estudo da Embrapa, que teve início em março de 2015, diversos recobrimentos estão sendo desenvolvidos e testados, para avaliação das propriedades do produto nanotecnológico e as melhorias que oferece na qualidade de ovos comerciais. "Estamos na fase laboratorial, desenvolvendo o produto e otimizando a solução que pretendemos usar", explica Francisco Noé da Fonseca, analista responsável pelo desenvolvimento e avaliação do produto.
Um dos revestimentos foi feito com base em um polímero biodegradável amplamente utilizado na indústria farmacêutica e de alimentos e incorporado de nanopartículas, de modo a se obter um filme que confira mais resistência à casca e reduza a permeabilidade. Entre as melhorias que ele oferece está a manutenção da qualidade interna do ovo, que limitou a deterioração interna, mensurada por parâmetros como perda de massa do ovo e altura da clara. No teste de aplicação do produto, os ovos revestidos mantidos em temperatura ambiente (sem refrigeração) durante um mês apresentaram-se em melhor condição comparados aos ovos não revestidos, que mostraram maior degradação. A próxima etapa desse estudo será a avaliação semanal da qualidade dos ovos revestidos para estabelecer o quanto eles resistem a mais que ovos não revestidos na prateleira.
A resistência à quebra de casca também se apresentou positiva, de acordo com o analista. Ao serem submetidos à compressão, a extensão da trinca ou da rachadura dos ovos revestidos foi bem menor em relação aos ovos sem revestimento, indicando um incremento à resistência da casca. Nesse caso, a película protegeu o ovo do impacto e não chegou a comprometer a estrutura interna. A pesquisa, agora, vai iniciar a etapa de ensaios microbiológicos e de qualidade.
Agregando valor
Outra possibilidade que será analisada no projeto, por meio das avaliações econômicas, é a de que o produto indicado para o revestimento dos ovos proporcionará ganhos financeiros e sociais na produção de ovos. "Com o revestimento, o tempo de prateleira ou vida útil dos ovos poderá ser ampliado e sem necessidade de refrigeração, garantindo valor agregado ao produto com valorização de toda a rede de varejo e distribuição porque oferecerá economia de energia", explica o analista Noé.
Explorar novos mercados é outro ganho que o produtor de ovos pode ter com a aplicação dos revestimentos, uma vez que o transporte desse alimento é algo frágil e acaba restrito a pequenas distâncias ou público. Com a nova tecnologia, o produtor poderá avançar na entrega, atendendo a demandas além da sua região, como as de outros estados, por exemplo.
O principal desafio do projeto é fazer um produto para ser aplicado em larga escala pelo mercado, em nível industrial. Para isso, a Embrapa aposta em parcerias. "Alguns parceiros já estão interessados em testar e validar o produto, tanto na parte de escalonamento da produção do composto nanoestruturado quanto em equipamentos para revestir os ovos", disse Noé.
Foco na casca
Considerando a questão de inocuidade, o ovo é um alimento seguro se seguidas todas as etapas de produção de maneira correta. "Se todas as fases do seu beneficiamento, como coleta, limpeza externa, classificação, acondicionamento e transporte, ocorreram de forma higiênica, não temos nenhum risco em consumir ovos", alertou a pesquisadora Helenice. Ela completa: "O cuidado se inicia na vacinação das aves produtoras, protegendo-as de doenças que impactam a saúde pública".
Muitos produtores fazem a limpeza dos ovos com água clorada, antes de refrigerá-los, para remover sujidades e reduzir a carga microbiana que adere à superfície da casca. Esse processo, alerta a pesquisadora, deve ser feito de maneira adequada para evitar danos à película (membrana) protetora da casca, o que permitiria a entrada de microorganismos.
A aplicação da cobertura nanoestruturada nos ovos surge como alternativa de aumentar a proteção natural da casca, devolvendo um recobrimento que foi "retirado" no momento da lavagem. "Com isso preserva-se a massa do alimento e impede-se a entrada de patógenos", comentou Noé. "É importante destacar que a película protege ovos saudáveis, oriundos de uma prática adequada de produção", enfatiza a pesquisadora Helenice.
A pesquisa de desenvolvimento de revestimento nanoestruturado para ovos integra a Rede de Pesquisa em Nanotecnologia para o Agronegócio (Rede Agronano), estabelecida pela Embrapa Instrumentação e agrega grupos de pesquisa em nanotecnologia aplicada às demandas do agronegócio.
A produção de ovos
Com um apontamento positivo da Organização Mundial da Saúde, o ovo se torna um alimento cada vez mais indispensável na mesa do consumidor. Essa cadeia produtiva tem um crescimento positivo no cenário de agronegócio nacional.
O consumo per capita aumentou para 34 ovos por habitante entre 2010 e 2014, saltando de 148,15 para 182,18 unidades comercializadas, conforme dados da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA). O plantel de poedeiras no Brasil teve um incremento de 2,15% entre 2013 e 2014, passando de 128,8 milhões para 131,6 milhões de aves.